segunda-feira, 16 de maio de 2011

) A quê você pertence?




Fale com qualquer teórico, professional, palpiteiro ou marketeiro de plantão e em algum momento da conversa ele vai citar a necessidade ou inclinação que temos de pertencer a algo. E que é dessa convicção que as marcas se aproveitam, criando produtos, promoções, seduções diversas para, ao final, oferecer colo a carentes ou a quem quer simplesmente ser "gente como a gente". É desse manual de pertencimento que espalham por aí que devemos nos formar, namorar, casar, ter filhos, ter uma vida bem sucedida e atender convenções sociais que nos afastem de qualquer risco de sermos a qualquer momento um pária da sociedade.
Mas como então explicar uma adesão cada vez maior da sociedade à homossexualidade, a famílias formadas por mulheres mais velhas casadas com homens mais jovens, a executivos abandonando carreiras tradicionais para experimentarem novas possibilidades de realização, a idosos voltando aos bancos das universidades e ativos profissionalmente, a maduros que não se aposentam, a crianças consumindo como adultos, e a jovens viciados em bebidas com cafeína para dar conta desse mundo acelerado? Simples: perdemos o medo das mudanças, estamos mais preparados para as transições, e como defende o teórico Zygmunt Bauman e seus livros “líquidos”, existe na sociedade contemporânea uma liquidez identitária que permite uma flexibilidade de práticas nunca antes vista.
Ou seja, para pertencer nos dias de hoje, basta aceitar sem precisar experimentar. Basta crer sem precisar viver. Basta assumir sem precisar usufruir. Por isso a tentativa das marcas em oferecer uma promessa de pertencimento é discurso vazio e insosso. O que parece culpa dessa “ sociedade a la carte” que o filósofo Gilles Lipovestky vive ilustrando em seus livros sobre hiperconsumo. Uma sociedade que consome mais, mas descarta mais rápido; que exige valores, mas não ampara as mudanças; que quer ter tudo, sem nunca descobrir o que realmente precisa. E assim caminha a humanidade rumo a uma realidade cada vez mais vazia e ironicamente excessiva.


Karina Arruda

quarta-feira, 6 de abril de 2011

) Contrafluxo



Num papo animado com uma amiga executiva recém chegada a São Paulo, caímos no lugar comum dos assuntos: a correria da cidade. Eu dizia que meu prazo de validade pra cidade havia vencido. Ela, ao contrário, estava completamente encantada com as, pasmem, poucas dores e muitas delícias que a cidade oferecia. E, determinada a me convencer, exibiu sua principal tese: “São Paulo me faz ganhar tempo”. Ah tá. E as horas de trânsito, e as chuvas que param a cidade e os cento e tomates quilômetros de engarrafamentos na 6af? Para ela, balela. Ela sai de casa, deixa a filha na creche logo ao lado, pega um contrafluxo para o trabalho, que fica ao lado da academia que frequenta antes de bater o cartão às 10h, quando começa o seu expediente.

“Ok”, disse, “é uma rotina diferente da maioria”. E tudo bem que ela não viva diariamente as mazelas da população paulistana, mas dizer que a cidade faz a gente ganhar tempo era too much pros meus neurônios. Aí ela argumentou, dizendo: “Sabe quanto tempo eu gastei para fazer a festa da minha filha? Um minuto e meio.” Fiquei com cara de paisagem e ela completou: “Dei um Google, achei um fornecedor, amei o site e mandei um e-mail. Me responderam antes do que imaginava de um jeito super profissional, com fotos, custos, recomendações de clientes recentes e uma proposta tão amarradinha que fechei sem pestanejar.”

Confesso que fiquei mais interessada no raciocínio do que propriamente defender o meu ponto de vista, porque tenho estado encafifada com uma impressão de que a nossa balança social é mesmo muito diferente. Temos muita elasticidade para tolerar o que pode parecer intolerável. Podemos suportar a corrupção se “ele rouba mas faz”, podemos perder horas no trânsito e viver sob o cinza e com barulho de buzinas agudas se na cidade as coisas funcionam mais do que em outras paradas, podemos eleger uma moça simpática e autêntica no reality show de maior audiência do país, mesmo com a suspeita de um histórico de promiscuidade em vidas passadas.

E até agora não sei se isso é um elogio ou uma crítica. Sob o aspecto de inovação, que é o objeto do nosso trabalho, acho uma super oportunidade: empresas têm a chance de experimentar mais, de ousar, de arriscar, sem o medo de esbarrar em uma cultura muito conservadora e critérios inflexíveis. Sob o aspecto de desenvolvimento, é um alerta de perigo, porque nos falta atitude para a mudança, para reagirmos contra o que não faz sentido, e nos falta mobilização para provocar transformações que podem nos fazer viver bem sem ter que, como compensação, sofrer também.


) Karina Arruda

) Weekly Report - 28 de março a 04 de abril de 2011

Weekly Report 28 Mar 04 Abr 11
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